Palavras transbordando de quem precisa sentir vento, cheiro
bom e olhares honestos. De quem ainda precisa que o silêncio e pés
desacompanhados sejam respeitados. Estar só é tão diferente de solidão. Às
vezes sinto o coração leve, e é nesse momento que as censuras são mais fortes.
Em alguns momentos ainda permito que elas me toquem, em outros não.
Há tanta censura, que até quem diz não fazer parte, deixa
suas pegadas nos olhares alheios. Percebemos no outro tanto do que precisamos
perceber em nós. Os contextos mudam, mas as raízes estão lá compartilhadas.
Temos uma lente pra cada situação. Alguns usam as mais grossas sem se dar
conta. Outros usam as lentes que deixam a realidade quase como ela é, porque as
lentes mais finas, por vezes permitem certezas que chegam antes da real percepção
desapegada, e as lentes são trocadas com muita facilidade.
Pra se encher de você, é preciso esvaziar as porções de mundo
desenhadas pelas consciências coletivas, que você também faz parte e ajuda a
construir. Há mais ilusões do que nossa noção de realidade e tempo podem
compreender. Quando conseguir isso, é hora de esvaziar o que acredita ser você.
Há tanta criação, ausências falsas e subterfúgios. Há tantas
certezas criando cascas. Há tanto eu perdido de si. Há tanto tudo resumido a
nada. Algumas cascas são quase intocáveis. Nós as fazemos assim. Essas são as
que precisam ser quebradas, desapegadas. Existem também as superficiais, cheias
de besteirinhas, facinhas de romper. Essas estão longe de ser o toque íntimo.
Pessoas criam cascas superficiais pra terem a consciência tranquila de estarem
quebrando algo.
Há tanto medo, realidade criada, aceita e vestida. Perceber
isso nos mostra o quanto nos distanciamos de nós, pra sermos mais uma consciência a construir e
compartilhar essa realidade que todos acreditam e vivenciam. E é quando
decidimos quebrar, nos desvestir de tudo, que o medo nos conta seus segredos e
nos faz querer ficar. E ele não vem sozinho, ele sabe o que incomoda.
A ideia de quebra nos ajuda, nos faz revirar e perceber
muito. Mas ela também é criada. A parte de nós que precisamos tocar está além
de tudo isso e não requer grandes aventuras e esforço pra chegar. Temos que
permitir que o medo vá, e tocar o que sempre esteve lá.
Natália Possas