segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O que importa

Tereza acordou bem, apesar do sonho. As imagens, que pareciam tão reais, fugiram. E as sensações eram brados em silêncio. Vestiu a habitual malha branca esfarrapada, e, nesse dia, deixou a cama por fazer. Prendeu os cabelos grisalhos e curtos com um arco velho, de plástico descascado. Não quis comer. Pela janela, com vista para o jardim simples, viu flores caídas. A madrugada foi acalantada pela chuva. O dia estava claro, sem sol. No mural de fotos, feito de cortiça, desordem. O último vento derrubou a maioria dos retratos, e sua desorganização não permitiu alterações. Havia empilhado as fotos caídas. Todas eram em preto e branco.

A sensação, que não podia ser traduzida, voltou. Atrás da cômoda de madeira havia outra fotografia caída, que já estava empoeirada. Na imagem antiga, um abraço de quem dava colo. A amparada era Dulce: menina linda, de olhos azuis brilhantes de choro, que todos evitavam. Tereza era a única que sabia transformar o brilho de lágrimas em alegria. E isso era infinitamente mais fácil do que muitos pensavam: ela sabia ouvir, enquanto os demais somente escutavam. A menina triste era sempre interrompida pelo que o outro tinha a dizer. Tereza, sempre a olhava atentamente nos olhos, enquanto o azul ficava mais brilhante e vivo, e entendia até as frases mudas. Dulce era importante ao lado da amiga.

Tereza ouviu alguém bater palmas na varanda. Era um vizinho. Homem simpático, que lhe deu uma carta, erroneamente entregue a ele. Fez questão de se desculpar pela demora na devolução. Tereza voltou ao quarto e abriu a correspondência. Nesse momento, a sensação pôde ser traduzida. Ela soltou os cabelos sem pentear, vestiu uma saia preta, que ia até os joelhos, blusa discretamente estampada, sapatilha preta, um casaco azul desbotado e saiu. Foi olhar novamente nos olhos da amiga.



Natália Possas - foto e texto

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Presente

É a primeira vez que posto algo não escrito por mim. Esse texto, que dialoga com o meu "Era uma vez", foi presente de um amigo. Ele postou em seu blog: fredfonsecaeseusalfredos.blogspot.com. Acessem, e descobrirão textos maravilhosos, que revelam várias faces de um cara interessante.

Aos passos de Natália Possas

Nada é tão previsível quanto a vontade de escrever e tão imprevisível quanto o hábito de reler os velhos escritos. É nessa aventura de releituras que misturamos nossos próprios mundos, o de hoje com o de ontem, e vemos que nos perdemos pensando se nos transformamos demais! Daí vem a "reviravolta boa" que nos organiza, direciona e relaxa. E descobrimos que o velho microfone foi deixado por nos mesmos no canto do vago palco, que agora limparemos pra bradar no volume 10 todos nossos anseios escritos!

Mãos a obra!

Alfredo Braga

sábado, 14 de novembro de 2009

Era uma vez

Inventação. Complicamento. Não existem. E daí? São compreendidas mesmo assim. Naquela tarde, e por muito tempo, alguém não entendeu o sentido do que era real, e misturou os mundos sem saber qual era o seu, sem ter entendido o outro. O imprevisível chama as sensações, traz reviravolta boa, e atrai o diferente.

Naquela tarde, e desde então, o previsível entoou seus versos, que ainda estão lá. A poesia subiu ao palco mal iluminado. E o microfone, que já não funciona tão bem, ainda está num canto sem poeira. Por pouco tempo.

Natália Possas

domingo, 1 de novembro de 2009

Despretensiosa



Esboço de idéias...
Despreocupada com impressões.
Só quero ser...
Agora!

Hum, momento especial...
Não quero me preocupar
E não estou.
É tão bom isso...

Estou apenas pra mim,
Pra um sorriso sincero,
Um gesto espontâneo.
Ah, uma festa!

Celebrar a mim!
Tudo!
Esse momento,
Essa paz,
Equilíbrio...

Mas um desequilíbrio...
Faz um bem...
Paradoxos precisam ser bem vividos!
É isso.

Ah, não se preocupe em me entender.
Apenas relaxe...

Natália Possas