Tereza acordou bem, apesar do sonho. As imagens, que pareciam tão reais, fugiram. E as sensações eram brados em silêncio. Vestiu a habitual malha branca esfarrapada, e, nesse dia, deixou a cama por fazer. Prendeu os cabelos grisalhos e curtos com um arco velho, de plástico descascado. Não quis comer. Pela janela, com vista para o jardim simples, viu flores caídas. A madrugada foi acalantada pela chuva. O dia estava claro, sem sol. No mural de fotos, feito de cortiça, desordem. O último vento derrubou a maioria dos retratos, e sua desorganização não permitiu alterações. Havia empilhado as fotos caídas. Todas eram em preto e branco.
A sensação, que não podia ser traduzida, voltou. Atrás da cômoda de madeira havia outra fotografia caída, que já estava empoeirada. Na imagem antiga, um abraço de quem dava colo. A amparada era Dulce: menina linda, de olhos azuis brilhantes de choro, que todos evitavam. Tereza era a única que sabia transformar o brilho de lágrimas em alegria. E isso era infinitamente mais fácil do que muitos pensavam: ela sabia ouvir, enquanto os demais somente escutavam. A menina triste era sempre interrompida pelo que o outro tinha a dizer. Tereza, sempre a olhava atentamente nos olhos, enquanto o azul ficava mais brilhante e vivo, e entendia até as frases mudas. Dulce era importante ao lado da amiga.
Tereza ouviu alguém bater palmas na varanda. Era um vizinho. Homem simpático, que lhe deu uma carta, erroneamente entregue a ele. Fez questão de se desculpar pela demora na devolução. Tereza voltou ao quarto e abriu a correspondência. Nesse momento, a sensação pôde ser traduzida. Ela soltou os cabelos sem pentear, vestiu uma saia preta, que ia até os joelhos, blusa discretamente estampada, sapatilha preta, um casaco azul desbotado e saiu. Foi olhar novamente nos olhos da amiga.